segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

ALAN RESNAIS 3 – MEDOS PRIVADOS EM LUGARES PÚBLICOS


Quem quiser pode fazer uma dobradinha com outro filme de Resnais (menos radical que Ervas Daninhas), "Medos privados em Lugares Públicos", em cartaz no HSBC Belas Artes há inacreditáveis três anos e meio. Resumidamente trata de três homens e três mulheres, todos solitários e que vivem no mesmo bairro, mas não se conhecem. Seus destinos irão se cruzar durante quatro dias. É adaptação de uma peça de 2004 de Alan Ayckbourn.
Reproduzo trechos do que disseram alguns críticos (material que que está em “A revolução discreta da memória” catálogo da mostra de 2008 do CCBB dedicada ao cineasta).




“Corações(título de Medos Privados em francês) poderia perfeitamente
intitular-se Sexos. Catedral translúcida, o filme é povoado por erotômanos
discretos: Dussulier de queixo caído diante de um vídeo pornô, os secretos shows
onanistas de uma beata, tagarelices obcenas de um um impotente, soldado bêbado
que propõe um último gole a sua ex-companheira(...)A solidão é patente e, antes
de tudo, sexual: um barman sua libido no culto à memória da mãe morta, uma
pequena Bovary puritana condena a porn addiction de seu irmão, mas freqüenta os
anúncios que nunca sabemos se são de amor ou de sexo”- Hervé Aubron, Cahiers du Cinema.



“Cada lugar de Medos privados é cortado em dois por uma
divisão fantasma, uma neve interior, parede no meio de uma janela, no primeiro
apartamento, cortina no bar do hotel Globe, divisória de vidro na agência
imobiliária, apenas perceptível pela lateral, porta aberta no quarto do pai, no
apartamento de Lionel”- Emmanuel Burdeau – Cahiers du cinema





“Algo, porém, soa estranho: o colorido dos cenários(...)certa disposição dos
espaços, que descolam não tão sutilmente da vida real. Aos poucos esses
personagens deixam de ocupar o lugar estático que tinham na narrativa e buscam
novas acomodações(...)a cada momento nos damos conta de que cada personagem tece seu próprio labirinto. Ele o esconde sob uma identidade, sob a aparência de uma
unidade. Mas Resnais parece que vai dispondo espelhos dentro de cada um,
enquanto a história se desenvolve, multiplicando-os, tornando-os ao mesmo tempo
quebradiços e estilhaçados mas também surpreendentes em sua diversidade e ricos
em seus paradoxos” – Inácio Araújo, Folha de São Paulo

Quem leu a postagem anterior entendeu por que esses paradoxos podem assustar o espectador. Ainda mais quando a norma hoje em cinema é acelerar o ritmo das cenas, diminuir sua duração e focalizar na ação. Volto ainda esta semana a falar sobre as convenções do cinema, tratando do cinema clássico.

Um comentário:

Clayton Melo disse...

Adilson, o "Medo Privados..." é um belo filme, não? E Resnais é Resnais, sempre alto nível.

Mas o que me intriga é ele está em cartaz no Belas Artes há uns três anos!!! Impressionante. O projecionista saiu para fumar um cigarro e não voltou mais?