terça-feira, 29 de dezembro de 2009

HQ- NEGRINHA


É verdade que 2009 está terminando, mas isso não é pretexto para se esquecer de “Negrinha”, excelente álbum de Jean-Cristophe Camus e Olivier Tallec que a Desiderata lançou como parte das comemorações do ano da França no Brasil. Delicado, profundo e emocionante são alguns dos adjetivos que se podem enfileirar para falar desta obra de rara sensibilidade em que cada quadrinho é uma pequena pintura em aquarela. Como é próprio da técnica, a atenção se desloca do desenho para as nuances da cor, que criam dois universos visual e antropologicamente distintos, o da casa e o da rua(parafraseando o livro do antropólogo Roberto DaMatta).
A imagem se abre para a imaginação, tão mais que o desenho imita o traço de uma criança, trazendo o leitor definitivamente para o mundo da pequena Maria, “morena quase branca” órfã de pai e filha de mãe negra e que mora com ela na casa dos patrões na Copacabana dos anos 1950. A menina tem um choque quando visita pela primeira vez o morro do Cantagalo, onde Olinda, sua mãe, cresceu e onde ainda vive sua família, quer ela mal conhece. Não se trata do enredo típico de telenovela, em que “menina rica se apaixona por menino pobre”, mas de mexer na intimidade da sociedade brasileira, naquilo que o sociólogo Gilberto Freire decifrou em sua obra mais famosa, Casa Grande e Senzala; a relação de dominação,porém não explicitamente(ou não necessariamente) conflituosa, com os negros que vivem na casa grande assumindo valores e costumes de seus senhores . Das imagens mais poderosas desta HQ estão uma página só com empregadas negras levando meninas loiras para brincarem na casa de Maria e Olinda rezando para santos católicos e do candomblé. Tal percepção tão aguda de nossa realidade pode ser creditada (pelo menos em parte) ao fato de Camus ser um francês filho de mãe brasileira. Negrinha é um belíssimo olhar estrangeiro sobre o Brasil, mais lúcido que muitos de nossos filmes e HQs.
O prefácio da obra fica é do músico e ex-ministro Gilberto Gil que é sinônimo de palavras compostas para maquiar de complexidade um texto bem simples. Dispensável.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

UMA ÚLTIMA POSTAGEM

O comentário fica para 2010, mas aqui está algo absolutamente genial, o filme Bastardos Inglóreos, de Quentin Tarantino, recriado em forma de HQ por Martin Duhovic. O detalhe é que não há um traço do autor, quer dizer, é como se o autor aqui (dos desenhos ao estilo do texto)fosse o mestre das HQs de super heróis dos anos 60-70 Jack Kirby.
Bem, este blog não vair parar ompletamente até 2010, apenas os textos exclusivos. Devo postar aqui algumas das críticas de HQs que faço para o site HQManiacs
Bem, de qualquer maneira, um feliz Natal e ótimo Ano Novo para todos.
Valeu pela presença aqui no bar !!

CINEMA - É PROIBIDO FUMAR


Bom, este blog entra agora, como o leitor também(eu imagino), em férias. Antes, porém, uma última dica, o filme É Proibido Fumar, da diretora Anna Muylaert (Durval Discos)que venceu o prêmio principal do 42º Festival de Brasília. No seu blog http://inacio-a.blog.uol.com.br/, o crítico Inácio Araújo disse "Achei formidável, sensibilíssimo, inteligentíssimo, um desses filmes que não vale a pena perder, não vale a pena esperar pelo DVD, nada". E é verdade. A história da professora de música que é fumante inveterada (Glória Pires)que se apaixona pelo vizinho, músico de bar e inimigo mortal do cigarro(Paulo Miklos), é uma história de amor à moda da diretora, ou seja, classe-média (mas média mesmo, não de novela) e com uma morte bizarra que, tal qual o fumo, põe á prova o amor do casal. Entre eles, uma disputa entre Chico Buarque(o preferido dela) e Jorge Ben (o dele)- "o Chico é...meio devagar, né" diz o personagem de Miklos. Aliás os diálogos são tão vivos que impressionam, provavelmente tem um trabalho envolvendo improvisação ali.
Uma história de amor sem atores com cara de quem faz Malhação e sem as convenções da omédia romântica, onde, om 15 min de filme você já onsegue antecipar tudo o que virá pelo frente. Insegurança, briguinhas familiares, picuinhas, tudo isso que faz a vida a dois de pessoas normais está lá. E é tão natural que até aquela morte absurda (não adianta, não vou dizer qual) se encaixa na normalidade toda.

Como disse o Inácio, não espere pelo DVD ou mesmo pelo Canal Brasil(ainda que este faça um trabalho bem digno ao exibir no formato original e não mutilar com intervalos comerciais). Um ou outro servem para se rever o filme (e há muita coisa ali para ser descoberta, aproveitada numa segunda vista), mas a experiência do filme, de qualquer bom filme, é no cinema.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

TEATRO - NATAL NOS PARLAPATÕES !

Apesar do violento episódio em que o drmaturgo Mario Bortolloto foi na sede de sua companhia de teatro, Os Satyros, a prgramação de natal do vizinho Parlapatões segue inalterada, como espécie de escudo contra a barbárie de nossa cidade.
São todas comédias natalinas. A hilária Auto dos Palhaços Baixos já foi apresentada ano passado,mas deve sofrer algumas mudanças, até por conta de toda improvisação do grupo.A história? Um diretor ranzinza e pretensioso e seu auxiliar, estiudante de cinema da Faap, tentam fazer um grupo de palhaços fracassados a encenarem a paixão de Cristo .Piadas internas, tiração de sarro com o mundo das celebridades, críticos de teatro que por fim leva boa parte do público para o palco. Imperdível !
- Missa do Galho, sábado(19), meia-noite.

- Farsas de Natal, sexta(18), meia-noite.

- Auto dos Palhaços Baixos, sexta, 21h30, sábado, 21h e domingo, 20h

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

CINEMA - ABRAÇOS PARTIDOS(E OS GÊNEROS CINEMATOGRÁFICOS)




Pedro Almodóvar é o James Cameron do circuito "alternativo" de cinema (aquele fora dos multiplexes), a julgar pelo frisson que causa no público. Filas enormes em sessões que normalmente não lotam as salas, gente falando do filme antes e depois dele ser exibido. Mas dessa vez Almodóvar decepcionou esse pessoal e não entregou um "filme do Almodóvar", ao invés disso teceu uma intrincada olha de retalhos cujo tecido não é outro senão a tradição cinematográfica. É claro que estão lá as paixões arrebatadoras e o uso ostensivo e agressivo do vermelho, tão caros ao diretor espanhol , mas ele foi bem além e costurou gêneros cinematográficos.


Cinema de gênero é aquele que obedee a certas regras internas; numa comédia é perfeitamente coerente que uma briga entre dois homens termine om um levando um tmbo e caindo de bunda no chão, tornando-se motivo de risos, o que o faria levantar e fugir envergonhado, o que soaria absurdo num filme de ação. Há gêneros e subgêneros inclusive, com situações e personagens que são caraterísticos só a eles. Os filmes de terror, por exemplo, tem uma certa gama de personagens próprios dele(aquela pessoa soturna que aparece e dá um mal presságio, um aviso à pessoa em perigo, mas que quanse nunca recebe atenção desta).


Pois bem, Almodóvar costurou o melodrama mais escancarado(aquele da telenovela mesmo) com a comédia rasgada, com o suspense e o terror. O mais brilhante disso é que ele o faz sem sacrificar a unidade da obra, sem torná-la declaradamente um experimento. Percebemos em qual gênero o filme se transformou em dado instante, mas em nenhum momento deixamos de nos identificar com os personagens. Almodóvar teve seu dia de Tarantino, por assim dizer. Em Kill Bill 1 e2 ele salta do filme de Kung-Fu para o Western, o de Samurais, volta para o western e por fim retorna o de Kung Fu. Isso mantendo as regras e os personagens típicos de cada gênero (o mestre Pai Mei é um desses).


Em abraços partidos, vemos também a deslumbrante Penélope Cruz se converter em várias figuras do mundo do cinema. Nas fotos acima, Audrey Hepburn e Marilyn Monroe.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

CINEMA - ATIVIDADE PARANORMAL


Falou-se muito, antes da estréia, deste Atividade Paranormal, do diretor estreante Oren Peli . Que custou 15 mil dólares e faturou mais de 120 milhões, que é o terror da década, que é uma porcaria, que pela internet circulou como se fosse um documentário sobre uma casa assombrada e que todo mundo acreditou nisso.

Não é o terror da década nem uma porcaria. Também é bem difícil que alguém tenha assistido trehos dele e pensado ser real, isso provavelmente é ação de marketing ara compara-lo a Bruxa de Blair, de 1999, de quem se falou o mesmo (que era o terror da déada, porcaria, verdade, mentira, etc). É um falso video caseiro em que um asal de jovens registraria a tal atividade paranormal em sua casa. Os 120 milhões de doletas foram feitos lentamente, não de uma paulada só, como pe praxe com os blockbusters americanos, o que talvez se deva ao fato de não tem cristão que não se lembre do filme ao levantar de madrugada para visitar o banheiro ou assaltar a geladeira. É uma recriação divertida do ancestral medo de escuro.

Atividade Paranormal foi comparado também ao terror espanhol REC. Só que aí o negócio é outro. Ainda que se finja fazer um video caseiro é preciso fazer cinema, neste casoe specificamente, cinema de gênero(terror) ou seja, dividir o roteiro em atos bem definidos, ter curva dramática etc. Isso está em REC, em Cloverfield-Monstro, no prórpio Bruxa de Blair. E este Atividade Paranormal peca ela falta de ritmo;quando parece que vai, não vai. E quando o terror chega com tudo, já é tarde demais, porque o filme está no final.

Mas oque há de mais importante é entender o motivo de tantos filmes simulando videos caseiros. Tanto pode ser a influênia dos reality shows (que eleva o vouyerismo cinematográfico a níveis ainda mais altos), pode ser a própria internet, pode ser a influência da narrativa dos games em primeira pessoa. Fico com a última possibilidade, pela força que ela pode ter nos jovens cineastas, mais ainda do que o cinema clássico(falei disso quando resenhei "Semum").

É só notar como neste Atividade Paranormal muita situação teria sido melhor resolvida como uma montagem tradicional. Mas vale a ida ao cinema.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

MAUS


Está chegando às livrarias novo trabalho do quadrinista de "vanguarda" Art Spigelman, autor de MAUS, única HQ até hoje já premiada com o prêmio Pulitzer(2002), o mais importante do mundo do jornalismo. Se Spigelman merece ser chamado de vanguarda (essa palavra requer cuidado, porque é delimitada históricamente) é por sua experimentação e liberdade com as imagens, que tornam muitas de suas HQs obras não-narrativas, exercícios de interação da imagem com as palavras, verdadeiro rompimento na tradição de contar histórias à que as HQs tem se dedicado desde sua origem.

Não é o caso de MAUS. Nesta obra cujo primeiro volume é de 1986, ele se rende à história, mas faz um cruzamento do "new journalism" (corrente jornalística surgida nos anos 1960 e que flertava sem medo com a subjetividade) com as artes visuais. A história se passa parte durante a segunda grande guerra, parte no presente, quando o autor entrevista seu pai (protagonista da história). Interagem a narrativa passada, om os sentimentos do autor e seus problemas familiares. Como se não bastasse, ele reinterpreta a peleja de seu pai nas mãos dos nazistas, retratando os judeus como ratos, os alemães como gatos e os poloneses como porcos, trazendo para MAUS toda a carga simbólica dessas criaturas (os judeus eram comparados a ratos pela propaganda oficial nazista). E, ainda por cima, a arte não está lá só para ilustrar a narrativa. Quem já viu esboços, ou mesmo a primeira versão da história (que é um conto ) sabe que ele pensou em desenhar "bem", mas abriu mão disso. Por que? Para que seu desenho parecesse bruto como uma xilogravura, que não existisse "beleza" como aquela que se vê normalmente nos quadrinhos e que, os quadrinhos amontoados, os detalhes encobertos pelo ontorno grosso das figuras causasse mal -estar, opressão.

Lê-se, MAUS, portanto em três níveis, como jornalismo(e documento de uma época), como uma história pessoal do autor e seu pai e como arte visual.

E uma obra e tanto.