Foi com pouco dinheiro, uma câmera digital e uma boa dose de criatividade que Rodrigo Aragão fez seu “Mangue Negro”, originalíssimo filme de zumbis de que circulou o país em diversos festivais e agora aporta direto nas locadoras, sem ter estreado em circuito comercial. O longa metragem consegue ser original num subgênero do terror que ,salvo raras exceções, tem tendência a se repetir; mais do que mortos vivos de andar trôpego, vemos ostras monstruosas (!) , defuntos surgindo da água escura do mangue e feitiçaria cabocla, tudo mostrado com ajuda de muita maquiagem, animação em stop motion e até computação gráfica. Já a história é uma fábula, quase um “João e Maria” ultraviolento, contando tentativa de um casal de fugir do mangue e chegar ao topo de uma montanha, onde estariam livres da epidemia de mortos-vivos.
Em meio a tantas idéias, umas funcionam, outras não. Talvez o maior problema esteja nos diálogos muito formais, de português corretíssimo, que tiram algo do impacto brutal do manguezal, e dos rostos tão diferentes do que estamos habituados a ver na TV. Nisso ele só teria a lucrar soasse como O Céu de Suely (de Karin Aïnouz), Cinema Aspirinas e Urubus (de Marcelo Gomes) ou Baixio das Bestas( de Cláudio Assis) . O cinema do nordeste tem se mostrado dono de uma identidade fortíssima e sem medo do acento regional. Também o uso da maquiagem para envelhecer rostos parece despropositado, deixa os atores com cara de boneco de cera ou de quem sofreu queimaduras graves.
Mais até do que a originalidade, salta aos olhos o laboratório de influências que é este filme. Tem algo do Zombie, de Lucio Fulci , por causa das cenas ensolaradas, dos mortos putrefatos. As vezes o herói parece descaradamente com o Ash, da série Evil Dead- A Morte do Demônio, de Sam Raimi, de onde Aragão também parece ter tirado o gosto pelo humor. Já a sangueira é típica de HQ , assim como o visual de alguns cadáveres . E é num instante que surge um cenário tratado digitalmente e uma câmera em primeira pessoa que faz parecer que estamos diante de um game estilo “Doom”. Há também cenas que foram tiradas da prateleira dos clichês do filme de terror (a mocinha encosta num parede de madeira, de onde surge a mão do monstro que lhe agarra o cabelo). Tudo ali parece uma colagem com vista a se chegar a um produto novo, com identidade própria.Está errado? Não mesmo. É dessa mistureba que vive o cinema de Quentin Tarantino e Robert Rodriguez, por exemplo.
Ninguém é obrigado a gostar do resultado, mas todo mundo deveria dar uma chance aos zumbis “mangue beat” de Rodrigo Aragão. Chance que as salas de cinema não lhe deram.
2 comentários:
Como diria a velhinha do filme, personagem mais divertida, esse filme "é um santo remédio, meu filho"!
Muito bom!
Fiquei com vontade de assistir esse! Meu camarada, vc sempre certeiro! Aquele abraço!!!
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