segunda-feira, 14 de junho de 2010

AS VEIAS ABERTAS DA FOTOGRAFIA




Semana passada vazou esta foto que a atriz Carol Castro fez para a revista Boa Forma que, tivesse ido parar na capa sem o devido tratamento de photoshop, teria um tom de ironia interessante. A foto vazou, a revista caiu em descrédito, como também a coluna da jornalista Mônica Bergamo na Folha, que deu a “photo” dizendo que a calcinha larga é que escondia a tatuagem que a atriz detesta) e, no Twitter, Carol reclamou das pessoas “maldosas”.
Maldosa mesmo,nessa caso, talvez seja a revista, que vende uma beleza que não existe(essa cor de pele, por favor!) e deixa milhares de mulheres detestando seu próprio corpo. Mas o assunto aqui não é esse, o que nos interessa (a mim pelo menos, ao leitor não sei) é o status da imagem fotográfica no mundo contemporâneo.



A fotografia surgiu no século 19 e mudou de vez os rumos da pintura, como todo mundo sabe bem. E o curioso é que embora no início não tivesse cor –e quando teve por um bom tempo os resultados eram desatrosos- a “realidade” ali se colocava como superior a uma pintura de um Courbet, por exemplo, que é de um realismo absurdo,muito superior ao de muitas fotografias da época. O fato é que se pensava na ciência da coisa, que, entre a imagem e o espectador não existia mais uma construção através da mão humana, o intermediário humano, mas uma máquina e, lógica algo cartesiana, a máquina, ausência completa de sentimento, era incapaz de distorcer a realidade.



A imagem fotográfica nunca foi digna de confiança nem livre de ambigüidade, mas não era isso que se pensava então, nem depois. O cinema clássico norte-americano (o dos na os 30 e 40) e boa parte do atual vivia e vive dessa fé; o que está filmado corresponde exatamente a um único significado, não deve sobrar dúvida em quem assiste sobre aquilo que assiste, não deve haver ambigüidade na imagem. Os anos 50 trouxeram a ambigüidade e você já não podia dizer o que um personagem estava pensando só de olhar para a expressão no rosto do ator.



Pois bem, todo esse caminho não para falar das veias nas pernas branquelas ou da barrida engolida da Carol Castro, mas sim do Photoshop. O professor da USP Arlindo Machado, uns 10 anos atrás já descrevia o atual panorama como pós-fotográfico, ou seja, a imagem não existe mais num suporte físico, o filme em negativo, mas num virtual, uma sequência de código binário e, exatamente por isso, manipulável em sua origem. E no cenário pós-fotográfico não cabe mais nenhuma espécie de fé na imagem exatamente por aquilo que vemos aí, a tatuagem da atriz desaparece junto com suas veias e barriga, muito embora tudo isso tenha sido fotografado. Qualquer garoto em casa pode fazer isso. Então nossa postura frente a imagem é não mais de fé(como no século 19) mas de descrença antes de tudo.
E isso se estende à imagem filmada. Quem pode dizer quais vídeos no youtube são verdadeiros ou manipulados?
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Isso tudo tem a ver, de certa forma, com a sociedade que valoriza a imagem acima do real, que precisa obsessivamente manipular a própria imagem, seja dizendo que é assim ou assado no perfil de um orkut ou facebook, seja transformando o corpo (anabolizante, silicone) seja fazendo caras e boas na capa da Caras. Mas isso é outro assunto, de que já tratei de certa forma ao falar de um pobre diabo no programa Domingo Legal http://bar1211.blogspot.com/2010/02/blog-post.html.

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