quarta-feira, 12 de agosto de 2009

HIPER-REALISMO




A primeira imagem, assim como a da postagem anterior, é uma escultura do artista plástico Ron Mueck feita em espuma de poliuretano e fibra acrílica, materiais comuns à construção de modelos para o cinema, principalmente para filmes de terror e ficção científica. A segunda, a foto de uma bailarina adolescente imitando a pose de uma réplica em bronze (como a que está no MASP) da escultura de Degas de que falarei mais adiante.
Muita gente deve se lembrar de “A Nona Hora”, polêmica escultura do espanhol Maurizio Catellan, em que o papa João Paulo 2º aparecia esparramado pelo chão, atingido por um meteoro e que, claro, causou protestos por parte da comunidade católica.A escultura fora feita num momento em que o Papa estava em cirrado confronto com idéias científicas, as quais Catellan represnetou na forma do meteoro.
São esculturas chamadas de hiper-realistas. Quem é fanático por Action Figures (os bonequinhos para marmanjos- pausa: eu mesmo comprei um, semana passada) sabe bem a que nível de perfeição produtos industrializados podem chegar. Uma miniatura de aprox. 40 cm de Marlon Brando em o Poderoso Chefão é de uma semelhança impressionante. Por aí, ainda que o trabalho de Muek ou Castellan seja muito superior tecnicamente, que a grande questão não está na semelhança com este ou aquele modelo. A primeira imagem é a obra “Um Fantasma” , de 1998 e que, apesar de seus 12 m de altura (ou até mesmo por isso), transmite de forma aguda toda a fragilidade de um adolescente em contato/confronto com o mundo.
A maior ou menor semelhança com um modelo (ideal ou real) deixou de ser a questão ou o objetivo da arte já no Séc.19, com Cèzanne, Gauguin e Van Gogh (lembremos que o impressionismo buscava uma fidelidade de outra ordem, científica, ao reproduzir perfeitamente o espectro das cores no olho de quem vê a obra). Cubismo, surrealismo, expressionismo e outras vanguardas radicalizaram e ampliaram essas conquistas.
No entanto, foi ainda durante o impressionismo que Degas, mais conhecido pelo seu trabalho com giz pastel, fez em 1878 “A pequena bailarina de 14 anos” escultura em cera coberta com tecidos , tal qual uma pequena boneca. No entanto era tamanho seu realismo que, quando de sua exposição, críticos sugeriram que seu lugar era o museu de etnografia (onde ficavam animais empalhados e reconstituições de ancestrais humanos )e a tacharam de grotesca. Apesar de seu realismo, era minúscula, o que criava o mal-estar. No entanto, Degas, ao lidar num só tempo com o real e o fantástico, travava ali um diálogo poderoso com seu tempo. Da postura a um só tempo altiva e arrogante da bailarina à sua posição social dúbia (grandiosa nos palcos, desqualificada fora deles – as bailarinas eram de famílias pobres, no entanto eram admiradas por ricos burgueses e muitas se tornavam suas amantes) está tudo nessa pequena criatura que era construída com material nada nobre (cera) e recoberta com roupas em tecido e que ainda tinha uma peruca, o que só contribuía para a rejeição do público. Degas, naquele momento, impunha uma questão ao realismo, que era o de qual seria seu lugar na História da Arte, qual sua função.
A atual geração dos hiper realistas encara novamente essa questão sob uma perspectiva ainda mais ampla, afinal o realismo deixou de ser a perfeita imitação da natureza dos tempos de Caravaggio ou Velazquez , tanto quando o retrato sem retoques da homem do povo levado a cabo pela geração naturalista de Courbet ou Daumier. Que sentido tem o realismo num tempo em que a imagem fotográfica ou cinematográfica, em decorrência da manipulação digital, perdeu seu estatuto de portadora da verdade documental ?
Mais do que ser perfeita como uma actionfigure, essas esculturas são obras de arte, por que a arte, afinal, é um discurso sobre a realidade.
PS. Mais uma vez peço desculpas ao leitor, afinal este texto estava prometido para segunda-feira.

Um comentário:

Daniel Luppi disse...

sobre o tema, saiu no portal Yahoo:
http://www.mundogump.com.br/pinturas-incriveis/